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sexta-feira, 27 de maio de 2011

Uma análise do poema Áporo de Carlos Drummond de Andrade


Áporo é uma palavra que até o momento têm 3 significados.

- Um inseto que cava terra a dentro
- Um teorema sem solução ou de difícil solução
- Uma orquídea

À primeira vista, esse poema de Carlos Drummond de Andrade(1902-1987) não impressiona muito, mas é simplesmente genial.

Temos, então, um áporo (inseto) que está em um áporo (situação difícil) e se transforma em áporo (orquídea).

Agora vem o melhor. Dissequemos o ponto central do poema, que é o inseto. A palavra vem do latim insectum, cujo radical é sec e indica que os insetos possuem corpo segmentado (imagine uma formiga e seu corpo compartimentado, por exemplo). No português temos a palavra inseto, cujo radical portanto é se.
A seguir, tomemos o radical se e listemos todas as sílabas que têm afinidade sonora com ele: si, ce, ci, ze, zi. Consideremos também o seu inverso es e sílabas afins: es, is, ez, iz, ex, ix.

Vamos então voltar ao poema e procurá-las:

Um inSEto cava
cava SEm alarme
perfurando a terra
SEm achar EScape.
Que faZEr, EXausto,
em paÍS bloqueado,
enlaCE de noite
raIZ e minério?
eIS que o labirinto
(oh razão, mIStério)
prESto SE dESata:
em verde, soZInha,
antieuclidiana,
uma orquídea forma-SE.

Observe como na primeira estrofe o radical se aparece "aprisionado" atrás de uma barreira de palavras.
 Nas duas estrofes seguintes, ele começa sua metamorfose em ze, ex, is, ce, iz e es. Na última, sofre a transformação final e liberta-se na palavra forma-se, na qual sílaba brota livre, como uma flor na ponta do caule. Forma-se verde como a esperança e antieuclidiana, desafiando toda a lógica.

Eis a minha Viajem:

Um inSEto cava
cava SEm alarme
perfurando a terra
SEm achar EScape.

Neste enigma o inseto – indivíduo se encontra em uma situação aporética, labiríntica. Perdido e oprimido por um regime que não lhe concede a liberdade
Veja como o poeta brinca com o radical da palavra Inseto, misturando o se do meio de uma palavra, levando ele para o começo de outra e o invertendo es. (Inseto - indivíduo perdido)

Que faZEr, EXausto,
em paÍS bloqueado,
enlaCE de noite
raIZ e minério?

Veja aqui como no centro do poema o inseto – indivíduo se perde mais e passa por um processo de metamorfose através de um trabalho árduo e paciente. O radical se depois de se inverter ele torna-se ze, ex, is e ce em um país bloqueado, envolto por terra sem muito que fazer a não ser cavar - trabalhar pacientemente para se encontrar, se libertar. Enlace de noite , escuro sem poder se ver ou ver o que faz, como saber para onde cavar e como cavar pois ele esbarra-se e complica-se, perde-se, mistura-se entre raiz e minério os quais são seus obstáculos.

eIS que o labirinto
(oh razão, mIStério)
prESto SE dESata:
em verde, soZInha,
antieuclidiana,
uma orquídea forma-SE.

No final da luta e ainda em metamorfose o inseto – indivíduo rompe toda a razão e o mistério da matemática. Antieuclidianamente.
Antieuclidiana, é uma referência à anti-razão. A razão está representada por Euclides, pai da matemática.
Rompendo a razão da matemática de Euclides, o inseto - indivíduoem forma de esperança verde brota em flor de três pétalas como oTriangulo de três pontas e lados iguais (a forma perfeita).
E separa-se da palavra forma, ganhando sua liberdade, se – individual, sendo melhor que as dificuldades.

O poema dá margem a várias interpretações. O áporo-inseto pode ser o cidadão oprimido pela ditadura no "país bloqueado", silenciosamente tramando a libertação na clandestinidade, "no enlace de noite, raiz e minério". A linha "presto se desata" sugere isso na alusão ao sobrenome do revolucionário Luís Carlos Prestes.
O áporo-inseto também pode ser o poeta que enfrenta o desafio da página em branco e finalmente logra escrever o poema. O texto vale-se de uma corruptela da corriqueira expressão "sem alarde" para acomodar "sem alarme", homenageando assim o poeta francês Mallarmé.

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